A sesta (1869), de Jacques Adrien Lavieille. |
Despertar com ambos alguma consciência. |
CÚMPLICES
Quebrei minhas algemas contra o espelho
E a teus olhos tracei-me nova imagem,
Sem cólera, sem armas, sem viagem.
Agora sou apenas teu reflexo,
Um fantasma sem brilho e sem escadas.
O que fui pouco importa. É quase nada.
Desprezei os ardis, a ironia,
As mentiras de bronze, as vozes fátuas,
O fascínio enganoso das estátuas.
Ergo-me pobre e nu contra o horizonte.
Nenhum crepúsculo turva minha fronte.
Sob um cipreste enterrei os meus defuntos.
Atrás de mim ficou o espelho fútil.
Além de mim descubro céus inúteis.
Mas que importa o caminho? Estamos juntos.
JOSÉ PAULO PAES (1926-1998). Poeta, tradutor, ensaísta e editor brasileiro, nascido em Taquaritinga, SP. Como tradutor de poesia, poucos se lhe ombreavam; como poeta, era puro estilo, variação, experimento, humor; como ensaísta, tinha a seu favor a inteligência, a contenção e a generosidade. O belo poema acima está em Um por todos (Brasiliense, 1986), que reúne toda a sua poesia até então.
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