"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

terça-feira, 7 de outubro de 2014

POETA-POEMA, 39: UMBERTO SABA

La France Croisée (1914), por Romaine Brooks.
| Expor um poeta, defini-lo com um só poema.
Despertar com ambos alguma consciência. |

A CABRA

Conversei com uma cabra.
Estava sozinha no campo, amarrada.
Saciada de capim, banhada
de chuva, balava.

Seu balido era irmão
da minha mágoa. E respondi-lhe, primeiro
brincando, depois porque a dor é eterna,
tem uma voz e não se altera.
Esta voz ouço
gemer numa cabra solitária.

Numa cabra de cara semita
ouço o lamento de todas as outras dores,
de todas as outras vidas.

UMBERTO SABA (1883-1957). Poeta e prosador italiano. De origem judaica por tronco materno, expressa em sua poesia o horror antissemita, como atesta este poema, traduzido por Paulo Mendes Campos, em Trinca de copas (Achiamé, 1984). Os trechos em itálico foram inseridos por mim, conforme o original italiano, presente no volume Pasolini e i moderni (Tascabili Bompiani, 1983).

Nenhum comentário: