"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

AS PUPILAS DE SAFO, 2


Não sou Ninguém! Quem é você?

Ninguém - Também?

Então somos um par?

Não conte! Podem espalhar!


Que triste - ser - Alguém!

Que pública - a Fama -

Dizer seu nome - como a Rã -

Para as palmas da Lama!



Muita Loucura faz Sentido -

A um Olho esclarecido -

Muito Sentido - é só Loucura -

É a Maioria

Que decide, suprema -

Aceite - e você é são -

Objęte - é perigoso -

E merece uma Algema -



Algumas Borboletas há

Nos Campos do Brasil -

Voam ao meio-dia só -

Depois - cessa o Alvará -


Alguns Aromas - vêm e vão -

À tua escolha, uma só vez -

Estrelas - que à Noite entrevês -

Estranhas - de Manhã -



Morrer por ti era pouco.

Qualquer grego o fizera.

Viver é mais difícil -

É esta a minha oferta -


Morrer é nada, nem

Mais. Porém viver importa

Morte múltipla - sem

O Alívio de estar morta.


EMILY DICKINSON (1830-1886). Poetisa norte-americana. Estranha, lírica, nova, maravilhosa, eterna. Descobrir e redescobrir sua voz, seus versos e seu ritmo é jamais se afastar - nem dela nem de si mesmo. Poemas traduzidos por Augusto de Campos e extraídos de Emily Dickinson: não sou ninguém (Unicamp, 2008).

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O FIM DO MUNDO

"Agora, note bem, só aquele que está totalmente preparado para a morte é que pode viver, e nós, tolos, morremos, porque só nos preparamos para a vida, e queremos viver a todo custo. A ordem que você vê ao seu redor, na verdade, é desordem, e a desordem é a verdadeira ordem. E o fim do mundo, no fundo, é o começo do mundo. É isto que eu queria comunicar a você."

DEZSÖ KOSZTOLÁNYI (1885-1936). Considerado por muitos o maior escritor da Hungria, pátria de maravilhosos escritores pouco conhecidos ou quase desconhecidos. Publicou romances, vários volumes de contos e poemas. Estreou no romance em 1922, com Nero: o poeta sanguinário. No Brasil, além de contos em antologias do conto húngaro, saiu O tradutor cleptomaníaco (1996), em tradução de Ladislao Szabo.

domingo, 27 de dezembro de 2009

A IMITAÇÃO

"É na imitação que se deve buscar a explicação para a maior parte das ações humanas. Quem se conforma ao costume passará sempre por homem de bem. São chamadas pessoas de bem as que fazem como as outras."

ANATOLE FRANCE (1844-1924), escritor francês, Nobel de Literatura de 1921. Inconformado com a intolerância e o fanatismo, foi um incansável defensor dos direitos humanos. O trecho acima é de seu conto Crainquebille, espécie de predecessor do absurdo de O processo, de Kafka.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

SÍMBOLO E ESPÍRITO DE NATAL


VERSOS DE NATAL

Espelho, amigo verdadeiro,
Tu refletes as minhas rugas,
Os meus cabelos brancos,
Os meus olhos míopes e cansados.
Espelho, amigo verdadeiro,
Mestre do realismo exato e minucioso,
Obrigado, obrigado!

Mas se fosses mágico,
Penetrarias até o fundo desse homem triste,
Descobririas o menino que sustenta esse homem,
O menino que não quer morrer,
Que não morrerá senão comigo,
O menino que todos os anos na véspera de Natal
Pensa ainda em pôr os seus chinelinhos atrás da porta.

MANUEL BANDEIRA (1886-1968). Um dos maiores poetas de língua portuguesa e do mundo, sem sombra de dúvida. Sua aparente simplicidade disfarça a dor humana, a ironia que mantém a espécie viva e o sentido de refinamento que marca toda a sua obra. O poema acima data de 1939 e foi publicado no volume Lira dos cinquent'anos.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O TEMPO E UM SÓ DIA

"Não é lícito julgar levianamente, como perversos, os homens íntegros, assim como não é justo considerar íntegros os homens desonestos. Rejeitar um amigo fiel, penso eu, equivale a desprezar a própria vida, esse bem tão precioso! O tempo fará com que reconheças tudo isso com segurança, pois só ele nos pode revelar quando os homens são bons, ao passo que um só dia basta para evidenciar a maldade dos maus."

SÓFOCLES (496-406 a. C.). Dramaturgo grego, que revolucionou a tragédia. Édipo rei (ao qual pertence o trecho acima) é sua principal obra. Supõe-se que tenha escrito cerca de 120 peças, mas somente 7 chegaram aos nossos dias, intactas, entre as quais Antígona, Ajax, Filoctetes e Electra. Tradução de J. B. Mello de Souza.

domingo, 20 de dezembro de 2009

O PENSAMENTO É UM MAL

"O que significa conhecer? Por exemplo: eu sei que sou Tolstói, escritor, tenho mulher, filhos, cabelos grisalhos, um rosto feio, barba; tudo isso está escrito no passaporte; quanto à alma, não há nada nos passaportes. Sobre ela só sei uma coisa: a alma quer estar próxima de Deus. Mas o que é Deus? Algo do qual minha alma é só uma partícula. É tudo. Para quem aprendeu a raciocinar, é difícil ter fé, e viver em Deus só se pode por meio da fé. Tertuliano disse: 'O pensamento é um mal'."

LIEV TOLSTÓI. Peso-pesado da literatura russa do século XIX, autor de Guerra e paz, Ana Karenina e de inúmeros contos e novelas que muito influenciaram escritores de todo o mundo. O trecho acima está no texto Liev Tolstói, de autoria de Máximo Górki, com pelo menos duas edições no Brasil, uma pela Perspectiva e outra pela Martins Fontes.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

MOÇA COM CHAPÉU DE PALHA

O título deste romance, Moça com chapéu de palha, antecipa muitos aspectos da técnica narrativa de Menalton Braff. De imediato, ele sugere uma composição impressionista, que induz o leitor a participar da criação do significado da obra. O texto é lírico, intenso, e a análise do narrador, voltada para a crise existencial mais grave de sua vida, modifica-se com o passar do tempo. Nesse sentido, o estilo narrativo de Menalton nos remete – ao reavaliar o mesmo fato à medida que o protagonista se distancia dele – à série de pinturas de Claude Monet sobre a catedral em Rouen.
Este livro ainda revela muitas cenas campestres, pinceladas como se fossem uma natureza morta. É quando também há maior abertura para o registro de cenas cotidianas, triviais, mas que, pela qualidade com que as tintas e os movimentos são manipulados, ganha um papel muito relevante em Moça com chapéu de palha: elas completam o painel impressionista, que vai misturar a leveza do erotismo com o peso da incerteza sobre a vida. As impressões nascem ora do que vai sendo mostrado com solidez, o amor entre o protagonista e Angélica, sua mulher, ora pelas incertezas do narrador em torno do seu destino.
E é justamente acerca das incertezas que o romance ganha um contraponto, um tom que por vezes, de modo instigante, nos faz lembrar da literatura noire, repleta de mistérios e suspenses. Acentua-se então o cenário urbano, da redação do jornal e das relações profissionais ali estabelecidas, da falta de ética, do poder que consome o compromisso com a verdade, um lema que a imprensa carrega consigo feito um estandarte.
De um lado, o campo, o cuidado na preparação da comida, na arrumação da mesa de jantar, no zelo com o jardim, na vida amorosa e sentimental, enquanto, de outro, estão a cidade e sua máquina incessante, brutal e estressante. Qual dos dois é mais verdadeiro? Qual dos dois é mais importante? São perguntas que se colocam neste romance e são formuladas em diálogo com a própria criação literária, num jogo metalinguístico que apenas um autor maduro como Menalton Braff poderia conquistar.

MENALTON BRAFF nasceu em Taquara, Rio Grande de Sul, em 1938. Autor de À sombra do cipreste (1999), A coleira no pescoço (2006) e A muralha de Adriano (2007). Contista, novelista e romancista, Menalton Braff é um dos escritores mais importantes da literatura brasileira atual.
Textos reproduzidos, com uma ou outra alteração, do release da editora LÍNGUA GERAL.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

LÓGICA DE MANETAS

Na madrugada de terça para quarta-feira, na garagem do meu prédio (Rua Rockefeller, 101 ou 10, Barris, Salvador, BA), um carro entrou em autocombustão, e em poucos minutos o fogo, que não foi contido nem pelo porteiro nem pelo vigia noturno, migrou para outros carros, consumindo ao todo seis veículos e danificando mais dois.
A princípio, um incidente sem grandes consequências ― ao menos para mim, que não gosto de automóveis. No entanto, o que se viu foi a instauração do pânico, pelos seguintes motivos: o prédio não estava preparado para nenhum tipo de incêndio, uma vez que eram poucos os extintores em condições de uso, e os bombeiros chegaram com mais de uma hora de atraso, e assim mesmo — segundo as testemunhas — só depois que um morador foi convocá-los no quartel! A alegação era a de que não havia, naquele momento, nenhum veículo disponível.
Já em ação, os bombeiros expuseram toda a sua perícia e coragem, apesar da falta de equipamento adequado — luvas, máscaras, escada, machado (tiveram que arrebentar o telhado da garagem com as mãos nuas) — e só meio-tanque de água. Felizmente, eles são bombeiros conscienciosos, verdadeiros heróis, a ponto de avançarem contra a fumaça tóxica para resgatar pessoas ou combater as chamas. Foi assim que eles retiraram, por precaução, várias pessoas do prédio. E foi assim também que eles encararam o fogo e o debelaram. No fim, o prejuízo ficou na conta do material, e os moradores voltaram às suas camas e aos seus afazeres, em meio à fuligem e ao cheiro intenso de borracha queimada.
O que prevaleceu, no entanto, foi a certeza de que fatos inesperados podem acontecer perto de nossa casa ou mesmo nas suas entranhas, e é aí — nestas circunstâncias de exceção — que vamos descobrir com “quem” estamos lidando. Numa cidade que é talvez a quinta ― se não a quarta ― capital do País, os bombeiros estão no século XIX em termos de equipamento. Estão enfrentando o fogo com a cara e a coragem, as mãos nuas e a água que encontram. Assim, muito embora o comprovado senso de profissionalismo e o heroísmo, fica difícil realizar um trabalho exemplar.
Bombeiros ― como água, polícia, saúde, esgoto, energia elétrica e educação formal ― é algo básico, que não pode faltar, nem muito menos ser oferecido a duras penas ou pela metade. Se assim for, é melhor que não exista, se não quisermos cair no vexame ou incorrer no papelão. Mas lembro bem que anos atrás minha esposa precisou fazer um exame específico nas duas mãos, e o Planserv autorizou apenas para uma, como se ela fosse maneta... Pelo visto, tal procedimento tornou-se uma prática comum, e o que tivemos nesta madrugada é o mais evidente exemplo disso: meio-tanque de água, meio-carro de bombeiros, meio-equipamento, meia-noite de sono... Só os bombeiros eram realmente inteiros! Lógica de manetas.

sábado, 12 de dezembro de 2009

ENTREVISTA

Patrícia Moreira (A tarde): 1 - Você foi um dos vencedores do III Concurso Literatura para Todos, do Ministério da Educação, o que representa para você o fato de ter se destacado entre os concorrentes?

Mayrant Gallo: Foi, acredito, a legitimação de um texto, de uma ideia e de um "tour de force", pois comecei a escrever essa história em 1997 e só a terminei no início deste ano, 2009. Foram nada mais nada menos que quinze versões em doze anos.


2 - Como veio a ideia de inscrever Moinhos? Você tinha outros livros que poderia ter inscrito? Quando Moinhos foi escrito?

Simplesmente eu vinha andando pela Rua Carlos Gomes e, na esquina com a Rua do Cabeça, ouvi esta frase, que se tornou o primeiro parágrafo da novela : "A que horas o senhor volta, doutor?" Pensei então que, embora banal, cotidiana, esta frase reunia talvez um mistério ou um sofrimento. Daí por diante a história será apenas a justificativa para a existência desta frase, naquele momento e naquele lugar. Havia outros livros sim, tenho muitos engavetados, mas ao ler a proposta do Concurso percebi que Moinhos se encaixava perfeitamente, em assunto e também em forma e tamanho — pouco mais de 50 páginas.

3 - Você já foi contemplado em outras premiações?

Uma vez ganhei o primeiro lugar num concurso de roteiro de histórias em quadrinhos... Um terceiro lugar num concurso de poemas... E um poema meu foi selecionado para uma antologia do Banco de Talentos, da Febraban... Foi tudo. Raramente participo de concursos literários. Não sei se participei de 5 ao longo de toda a vida. Devo a participação, e a vitória, neste do MEC a três amigas de trabalho, que me incentivaram.

4 - O que o fato de ter vencido este concurso representa para você, além do fato de ter recebido um prêmio em dinheiro e da impressão de 300 mil exemplares da sua obra para distribuição na rede pública?

Significa o reconhecimento do "outro" por minha opção estética e minha predileção — ambas muito pessoais — por um determinado gênero de literatura. Se o júri selecionou Moinhos como útil para a formação e o deleite de um público específico, os neoleitores, isso atesta que minhas escolhas, embora idiossincráticas, não são um equívoco.

5 - Os escritores têm boas oportunidades de mostrar o seu potencial no Brasil? O que na sua opinião precisa melhorar para estimular mais o surgimento de novos escritores?

Acho que não. A leitura, e ainda mais a leitura de literatura, não faz parte do cotidiano das pessoas comuns. Ler literatura para quê? É o que muitos perguntam. Ora, ler para sair do embotamento, para ampliar nossos horizontes, para nos tornarmos melhores, nos refinarmos, para uma experiência (estética e empírica) que é aplicada diretamente à vida. Não precisamos de mais escritores; precisamos de mais leitores, e sobretudo leitores de literatura. A literatura oferece um conhecimento vasto e profundo, que amplia e multiplica o sujeito, e que nenhum outro livro é capaz de proporcionar. Uma civilização que se educa lendo literatura tem mais a dizer e diz melhor o que quer que seja.

6 - Você trabalha na Fundação Pedro Calmon e é responsável pelo setor ligado à literatura. No que esta convivência com os livros ajuda a compreender o que o leitor contemporâneo espera daqueles que têm o dom de escrever?

Não sou responsável pelo Núcleo do Livro, Leitura e Literatura da Fundação Pedro Calmon. A coordenadora do Núcleo é Lúcia Santóri-Carneiro. Trabalho com ela na elaboração de seminários de literatura e leitura, publicação e feira de livros etc. O leitor contemporâneo não deve esperar que se escreva para ele, não em literatura. Deve aproveitar o que está sendo produzido e publicado, como sempre aconteceu em todas as épocas. Literatura não é cartilha ou um manual de sobrevivência. Literatura é experiência pessoal convertida em experiência humana, geral. Os contos de Antônio Carlos Viana ou os poemas de Ruy Espinheira Filho "falam de mim e para mim" exatamente porque estão centrados em dilemas da condição humana, mexem em nossa medula, tocam na essência primordial do gênero humano, na massa de sentimentos comum a todos nós.

7 - Você acredita que esteja havendo mudanças no perfil do leitor brasileiro? O aumento do poder de compra da população em razão do crescimento econômico torna o consumo de livros um hábito cada vez mais presente na vida do brasileiro?

Obviamente estamos lendo mais, as pesquisas mostram isso, talvez até mesmo por causa do crescimento econômico e do aumento do poder de compra... Só não estamos "lendo mais literatura". E essa é uma leitura importante, transformadora, desvinculada do poder (qualquer que seja ele) e que nos apresenta a "verdadeira face do mundo". Todos os livros de auto-ajuda ou História não valem este ensinamento de Drummond: "Tudo é possível, só eu impossível". Este verso pode se converter no ponto de partida de uma nova vida ou de uma percepção mais acurada da existência e de nós mesmos.

8 - O que você quis mostrar ao escrever Moinhos?

Que a vida é cruel e injusta, mas não inteiramente.

9 - Na sua avaliação, a democratização da literatura, nos moldes do concurso Literatura para Todos é um caminho para disseminar e tornar mais conhecidos os novos autores nacionais?

Os autores se tornam conhecidos quando são lidos; se podem, potencialmente, ser lidos por 300 mil leitores, podem se tornar mais conhecidos... Mas o que são 300 mil leitores num universo de 200 milhões de habitantes? Ainda acho que a Literatura caminha, pelo menos no Brasil, para ser uma arte exótica, de iniciados. Como dizia Leminski: de produtores para produtores.

Esta entrevista, concedida à jornalista Patrícia Moreira, foi publicada em parte na edição de hoje de A tarde, no Caderno 2+, página 7. Vai aqui na íntegra e na ordem em que foi respondida.

Imagem: capa do volume Bibliomania, de Gustave Flaubert. Neste conto, que o autor teria escrito com a idade de 14 anos, inspirado num texto de Charles Nodier, narra-se a história de Giácomo, o livreiro: "Essa paixão absorveu-o completamente, mal comia, não dormia mais, sonhava porém noites e dias inteiros com sua ideia fixa: os livros".

domingo, 6 de dezembro de 2009

JUAN JOSÉ MOROSOLI

Uma das melhores publicações literárias deste fim de ano é, sem dúvida, o volume de contos A longa viagem de prazer, de Juan José Morosoli. Publicado inicialmente em 1991, também pela L&PM, sai agora em bela edição da coleção L&PM Pocket, enriquecida com prefácio, prólogo, posfácio e cronologia do autor. Morosoli (1899-1957) é, como contista, um dos principais autores da literatura uruguaia, ao lado de Juan Carlos Onetti, Horacio Quiroga, Mario Arregui, Mario Benedetti e Felisberto Hernández. Seus maiores méritos são a aparente simplicidade, a exatidão, a economia de linguagem e a predileção pelos seres solitários, do campo, viris, niilistas, estoicos, graves. Em nove contos breves, mas profundos, irônicos e de uma vividez que chega a nos abalar, Morosoli mostra por que é um autor admirado, especialmente pelos escritores. Confiram o trecho abaixo, do conto O burro. O tom de anedota disfarça a imersão filosófica. A tradução é do escritor gaúcho Sérgio Faraco.

Certa vez Anchordoqui perguntou:
"Não vais nunca ao bolicho?"
"Pra quê?"
"Ué, tomar uns tragos, jogar truco..."
"E depois ter que pelear?"
"E as mulheres, não te agradam?"
"Pra quê? Pra te encher de filhos?"
Anchordoqui seguia perguntando, confiava em deixá-lo sem resposta.
"E um cachorro? Não tens?"
"Pra quê?"
"Como pra quê?", reclamou Anchordoqui, mal-humorado. "Pra ter, só isso, pra que as pessoas têm cachorros?"
"Se é só pra ter, melhor não ter."
"Mas uma diversão qualquer...", gemeu Anchordoqui, em retirada.
"Queres melhor diversão do que viver como eu vivo?"
E desta vez foi Anchordoqui quem não respondeu."

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O LÍDER

Para quem não conhece, esse é o Líder: um restaurante localizado no bairro do Dois de Julho, Centro de Salvador. Ali, esporadicamente, alguns escritores se encontram, bebem, comem, jogam conversa fora, falam de literatura (sem a pompa nem o esnobismo do tema), de cinema, futebol e livros raros, recém-lançados ou recém-descobertos: Lady Macbeth do Distrito Mtzensk, de Nikolai Leskov, e O fantasista, de Hernán Rivera Letelier, por exemplo. O primeiro, uma história de crime; o segundo, de futebol; ambos, porém, literatura. No último encontro, sábado passado, compareceram, na ordem da foto, Gustavo Rios, Lima Trindade, Tom Correia, Carlos Barbosa e eu. Celebramos os nossos livros. Os que já estão em fase de produção ou os que acabaram de receber um ponto final, caso do novo volume de contos do Gustavo. Lima segue escrevendo seu romance, que, como é da natureza do gênero, se estenderá até o ponto em que a história quiser. Aos curiosos, esclareço que é neste bar que Victor Vhil marca ponto, bebe café, raramente uma cerveja, e conta suas histórias...

O crédito da foto é de Itamar, garçom, que, mal a tirou, disse com propriedade: "Ficou excelente!" De fato.