"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

quinta-feira, 9 de março de 2017

SÁBADO, ARRESTO & SARAMBOKE


Bernardo Almeida e Elizeu Moreira Paranaguá lançam seus novos livros: Arresto e Saramboke. Sábado próximo, na lendária Cantina da Lua, a partir das 15:30. As obras saem pela editora Penalux, sediada em Guaratinguetá, SP.  A falta de editor de literatura na Bahia leva a isso.

Tudo bem, por aqui há coisas bem mais importantes que Literatura: Carnaval, Bahia, Vitória, o manequim de Ivete Sangalo, quanto calça Daniela Mercury, qual foi a melhor música-sem-letra-só-refrão do último calvário de dez dias promovido pelo Governo do Estado e pela Prefeitura de Salvador...

"Para que ler? Serve para quê, mesmo? Livro, o que é livro? É a Bíblia? Um monte de papel pintado com tinta..."

Bem, nunca é tarde para se começar a ler, bom livro é o que não falta. Sábado, teremos Arresto e Saramboke.

terça-feira, 7 de março de 2017

VÁ E VEJA, 26: Marius & Fanny

"Fanny", de Marc Allegret, 1932.
No caso de alguém supor que é um único filme, esclareço que são dois; na verdade, três: César completa a chamada Trilogia de Marselha, baseada em peças do importante escritor francês Marcel Pagnol (1895-1974), que assina os roteiros. Os dois primeiros, já lançados no Brasil pela Colecione Clássicos, foram dirigidos, respectivamente, por Alex Korda e Marc Allegret. Inclusive, os fãs já têm a conclusão da trilogia, com o lançamento de César, também à venda no site.

Datados do início do cinema sonoro, 1931 e 1932, estes dois filmes surpreendem pela qualidade praticamente em todos os aspectos. Roteiro e direção excelentes, personagens vivos e humanos, magnificamente interpretados pelos atores, cenário preciso, fotografia limpa, alcance atemporal de motivos, com assuntos ainda atuais e debatidos de forma clara e proveitosa.

Cada filme recai sobre um dos personagens principais da trilogia. Marius é filho de César, dono de um bar, e tem uma leve atração por Fanny, filha da dona da peixaria do cais. Em Marius, o personagem se divide entre o amor por Fanny e a atração insuportável por viajar, a bordo de algum navio. Quando surge a oportunidade, ele tem que escolher entre Fanny e o mar. Em Fanny, a garota segue seu martírio, amando Marius e tendo que se desvencilhar ou aceitar outras propostas de casamento. César, centrado no pai de Marius, espécie de conciliador sentimental e cabeça pensante do cais, completa a trilogia e, provavelmente, ajusta as peças da trama ao fluxo da vida.

Cheios de humor e vida, Marius e Fanny são dois filmes imperdíveis para todos os cinéfilos que não se limitam a ingerir os enlatados hollywoodianos, em nada diferentes dos livros de estação, que, tão logo lidos (ou vistos), são esquecidos. Clássicos irretocáveis do cinema francês, Marius e Fanny reverberam e ecoam por dias em nossa percepção. São o que se espera de qualquer arte: que nos alimente e transforme, que nos encante e revigore, que destrua ou refine as nossas convicções.

quinta-feira, 2 de março de 2017

50 ANOS!

Andréia Gallo (1967-2015), com Julinha.
Hoje, dois de março, se viva, Andréia Gallo completaria 50 anos! Talvez a pessoa mais inteligente que conheci, ela era, no entanto, e sem nenhum paradoxo, generosa e muito discreta. Uma alma boa, delicada, que por 24 anos ininterruptos dividiu-se comigo e, sem nem mesmo uma única palavra ríspida ao longo de todo esse período, me ensinou que a grandeza está em ser pouco ou mesmo nada, em ser contido e moderado, se não anônimo. Ela viveu assim, e assim partiu. Jovem, e creio que irrealizada, mas ainda assim completa. Sábia.

Ela amava as estrelas, os planetas, as galáxias. À noite, com frequência, buscava no céu estes seres perdidos para os quais nós, indivíduos comuns, viramos as costas com desdém. Não raro, ao acordar, me dizia que sonhara que estava voando. Ano passado, li num livro que sonhar que se está voando é mau presságio, sinal de morte, de um trágico fim para a pessoa que sonha ou para um ente querido, bem próximo. E não foram poucas as vezes em que Andréia me contou sonhos de profundos mergulhos no céu. Mergulhos que ela lamentava não ser de verdade, impulsionada que se sentia pelas asas vorazes de seus sonhos.

Onde estará ela agora? No céu? Talvez. Ou, melhor dizendo, seguramente no céu. Mas não neste céu banal e enganoso em que os religiosos depositam todas as suas fichas. No céu propriamente. Físico. O céu com o qual ela tanto sonhara. O céu de mistérios, luzes, cores, abismos e, por certo, seres melhores do que nós. Num de seus versos preferidos, de autoria de Murilo Mendes, o poeta diz: "Quase que só há estrelas". Mais nada, coisa alguma, pois tudo o mais é êfemero e pouco reverbera. Os astros e as estrelas não. Estão lá! Brilham, voam e a ninguém incomodam. Por isso mesmo se projetam para além de si mesmos e de todos nós.

Sim, quase que só há estrelas. E nada mais.