Edição de 2013, em capa dura. |
"Hoje, mamãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem. Recebi o telegrama do asilo: 'Sua mãe faleceu. Enterro amanhã. Sentidos pêsames'. Isso não esclarece nada. Talvez tenha sido ontem.
O asilo de velhos fica em Marengo, a oitenta quilômetros de Argel. Vou tomar o ônibus às duas horas e chego ainda à tarde. Assim posso velar o corpo e estar de volta amanhã à noite. Pedi dois dias de licença a meu patrão e, com uma desculpa desta, ele não podia recusar. Mas não estava com um ar muito satisfeito. Cheguei mesmo a dizer-lhe: 'A culpa não é minha'. Não respondeu. Pensei, então, que não devia ter-lhe dito isto. A verdade é que eu nada tinha por que me desculpar. Cabia a ele dar-me pêsames. Com certeza irá fazê-lo depois de amanhã, quando me vir de luto. Por ora é um pouco como se mamãe não tivesse morrido. Depois do enterro, pelo contrário, será um caso encerrado e tudo passará a revestir-se de um ar mais oficial."
CAMUS, Albert. O estrangeiro. Rio de Janeiro: Record, 1999. Trad. de Valery Rumjanek. 126p.
ESTILO. As frases curtas, límpidas e analíticas, a serviço da experiência do sujeito num mundo que não o compreende, disfarçam uma sensibilidade poética que ao longo de todo o romance posicionará o protagonista de um lado e a sociedade que o inclui do outro. Esta exige dele comportamento padronizado e cumprimento de regras e costumes, enquanto ele, por sua vez, pretende viver o momento, num estado de hedonismo, que constitui, talvez, a essência da própria condição humana.
Um comentário:
Agradeço a você por ter me indicado essa leitura.Dentre muitos, considero "O estrangeiro" E "a MORTE DE iVAN ilitch" dois livros que de fato mexeram comigo,sai outro depois da leitura, assim quando também li "Os miseráveis". Realmente é lamentável que textos dessa natureza, e nenhum outro, seja de que natureza for, sendo literatura, não circulem na sociedade, não sejam valorizados. As pessoas não tem ideia da perda. Jamais pensarão nisso, morrerão eunucos de ideias, de sentimento e de pensamento.
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