"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

domingo, 21 de junho de 2015

INÍCIOS EXEMPLARES, 4: Luiz Vilela

Capa da primeira edição, 1979.
"O Rei da Sinuca era um salão de jogo no primeiro e único andar de um prédio, numa rua sossegada, em nossa pequena cidade. Era nele que nos encontrávamos toda tarde para fazer passar o tempo na mesa de sinuca e nas garrafas de cerveja, entremeadas de sanduíches de mortadela.
 
O salão era como que o nosso segundo lar (para alguns talvez o único): tínhamos com ele a familiaridade que tínhamos com o nosso primeiro, ou mesmo familiaridade maior ainda. Sentíamos ali uma ligação profunda com cada coisa, ligação que começava na escada, continuava no balcão e nas mesas de mármore, e ia terminar na terceira mesa verde, a namorada fiel de todos."
 
VILELA, Luiz. O choro no travesseiro. São Paulo: Cultura, 1979. 80p.
 
ESTILO. Despretensiosas, as informações vão se sucedendo: o local de encontro dos rapazes, numa cidadezinha; a necessidade de fazer passar o tempo, o jogo diário, a bebida; a ideia de "segundo lar", ou mesmo "único", para alguns; a preferência pelo local, em detrimento da própria família e, por fim, esta surpresa semântica: a mesa de sinuca como uma mulher, namorada "de todos" e, ainda assim, "fiel". Em tom de causo, mas ciente de que literatura é transformação, Luiz Vilela torce, em apenas dois parágrafos, a consciência do leitor.

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