"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A IRMANDADE DOS ERROS

Capa: Sérgio Liuzzi.
Foi o escritor Dênisson Padilha Filho quem me avisou que o romance A irmandade da uva tinha sido publicado no Brasil, em maio deste ano, pela José Olympio Editora. Eu me valia até então da edição da espanhola Editorial Anagrama, de 2004. Belíssima, a propósito. Um livro impecável. Não podemos dizer o mesmo desta edição da saudosa José Olympio. Primeiramente, deve-se esclarecer que a José Olympio é hoje um cômodo do Grupo Record. Não lembra em nada a grande editora que foi, com a sua magistral coleção Sagarana, que reunia grandes autores brasileiros, como José Lins do Rego, José Cândido de Carvalho, Guimarães Rosa, Cyro dos Anjos, Antônio Olavo Pereira, Dinah Silveira de Queiroz e tantos outros. E que estampava os mais generosos textos de colofão já escritos no Brasil, lembrando os aniversários de eminentes personalidades do conhecimento e das artes, brasileiros e estrangeiros.

Meu primeiro problema com esta edição do romance de Fante pela José Olympio começou na página 30, com a nota, que aqui transcrevo: "Fante errava muito na ortografia italiana. No caso, o correto é 'paesani' (N. do T.)". Ora, toda esta pose só porque aparece no texto a forma "paisani". Que deselegante! E que desperdício de forças e ideias! Parece, de fato, que, em geral, nós, brasileiros, adoramos desmitificar quem quer que seja, de escritores a expoentes da música popular. Detestamos os bem-sucedidos, odiamos os supostos heróis. Na edição espanhola, que prescinde de nota, aparece tão somente, também à página 30, a forma "paisanos". Simples, direta, elegante. Mas aqui, no Brasil, precisamos, em favor de um preciosismo de tradução, transcrever a forma original em italiano, pôr nota, grifar que houve erro do autor e sermos grosseiros.
 
Daí por diante, minha leitura, que é sempre atenta a tudo, não perdoou os responsáveis por trazer este livro de Fante para o nosso idioma. Na página 63, encontramos: "Puxou do bolso um lenço de bolinhas, 'assuou' o nariz e emborcou outro trago de vinho". A forma correta é "assoou", do verbo "assoar", limpar o nariz. "Assuou" é forma conjugada de "assuar", cujo sentido é "insultar com vaia, vaiar, apupar". E não é de se conceber que Fante escreveria: "Puxou do bolso um lenço de bolinhas, 'vaiou' o nariz e emborcou outro trago de vinho". Só em literatura fantástica ou linguagem figurada alguém "vaia o nariz". Gogol (ou Gógol), certamente, escreveria isso em seu conto O nariz!
 
Por fim, e para não me acusarem de que leio os livros somente em busca de erros, lá está na orelha este tesouro: "João Fante foi acometido de diabetes em 1955". João Fante! Deus, fico pensando se se referem a Machado de Assis, nos EUA, como "Axe de Assis, autor de Dom Casmurro".
 
Bem, encerremos com uma nota: a editora José Olympio erra muito. Atualmente.

3 comentários:

Unknown disse...

Verdade, Mayrant.
Ma que catzo questo maledeto traduttore busca, não é verdade? Talvez, e em vão, aparecer mais que o eterno Fante...

Grande abraço!

Carlos Vilarinho disse...

rs, esculhambar com pose de oreba é o que rola... rs

Goulart Gomes disse...

Errare humanum est! (está escrito certo?)