"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

domingo, 16 de janeiro de 2011

VÁ E VEJA, 15: JUVENTUDE

Domingos Oliveira, diretor de uma das obras-primas do cinema brasileiro, Todas as mulheres do mundo, coloca três homens numa enorme casa de campo, em Petrópolis, e, em meio a boa comida, bebida, música, cinema e literatura, discute assuntos como sexo, masculinidade, a vida, o amor, a juventude, a dor de viver e de amar, as mulheres, o dinheiro, as drogas, os sonhos que aos poucos se evaporam e, por fim, a irremediável velhice cuja culminância é a morte. O desfecho reafirma a ideia de que os homens passam, e a vida permanece, diariamente revitalizada pelo nascer do sol.

Um dos momentos mais importantes do filme, e de certa forma simbólico, é aquele em que a jovem empregada da casa se aproxima de um dos personagens, que, recostado numa poltrona, recuperava-se de um "quase-infarto", e, pegando sua mão, começa a rezar: segundos depois ele se levanta, não sabemos se recuperado pela oração ou reagindo, como ateu ou agnóstico convicto, à "interferência divina".

O estilo de Domingos Oliveira é espontâneo, com câmara na mão, improviso e roteiro repleto de ironias e referências à literatura, ao cinema e ao conhecimento humano, desde os gregos. Uma vez que muito do desenvolvimento de seus filmes se dá através da palavra, do diálogo, não é demais afirmar que seus irmãos de estilo são Eric Rohmer e Woody Allen, dos quais ele se aproxima e ao mesmo tempo se distancia. Aliás, quando Domingos Oliveira estreou com Todas as mulheres do mundo (1967), Woody Allen ainda não havia achado sua arte, e Eric Rohmer vivia indeciso entre a Nouvelle Vague (Minha noite com ela, 1969) e um suposto neorealismo francês, que o marcou com O signo do leão (1959). Domingos Oliveira, por sua vez, começou solitário no Brasil em 1967 e chegou a Juventude, em 2008, fiel a si mesmo e avesso aos modismos de última hora.

Se existe um cineasta brasileiro da atualidade que vale a pena conhecer de ponta a ponta é Domingos Oliveira, e Juventude pode ser, em sentido inverso, o princípio do iceberg.

Um comentário:

Anônimo disse...

Domingos Oliveira é um cineasta único, o mais autoral dentro de nossa cinematografia. Vê-lo junto com o protagonista de Todas as mulheres do mundo torna ainda mais prazeroso assistir Juventude. Aquele abraço.