"Eu respirava naquelas salas, como um incenso, esse cheiro de velha biblioteca que vale todos os perfumes do mundo." Antoine de Saint-Exupéry

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O GIBI JUBIABÁ

Amanhã, a convite da Fundação Pedro Calmon, para o seminário A atualidade de Jorge Amado, estará entre nós, na LDM Livraria Multicampi, às 17 horas, o cartunista paulista Spacca, autor da recente adaptação de Jubiabá para os quadrinhos.
Particularmente, não sou do tipo que espera encontrar fidelidade num filme extraído de um texto literário. São linguagens distintas, que demandam escolhas ora funcionais ora artísticas, sem contar as dificuldades que há em transpor para a “imagem visível” uma cena que no romance ou no conto é apenas sugerida pela força ou pelo sentido das palavras.
Com as histórias em quadrinhos não é diferente. Spacca teve que eleger sequências importantes e abdicar de outras. Deixou de lado uma das passagens mais bonitas do romance de Jorge Amado ― o capítulo “Vagão”, que pode ser lido como um conto ― em favor de uma narrativa mais fluida e acelerada, de uma representação mais pitoresca da realidade expressa no romance e também da personalidade de Balduíno, que mistura austeridade e arrogância. “Vagão” se insere num ponto de interlúdio da narrativa, quando Baldo, após agredir um peão da fazenda de fumo, escapa pelos matos e toma um trem para Feira de Santana. O ambiente sombrio e opressivo do interior do vagão contamina os personagens e os impõe a refletir sobre suas vidas e sobre a existência de um modo geral, num tom quase de adágio, que contrasta com o resto do romance, mais febril e colorido.
O próprio Spacca admitiu o ritmo lento e destoante deste trecho, optando por sua supressão. Ou seja, o que no romance Jubiabá é natural ― afinal de contas estamos diante de um gênero que se notabilizou mais pelo seu caráter informe que propriamente pela exatidão, e que se permite qualquer arrojo formal ―, no gibi torna-se um excesso, uma matéria sem grande utilidade e que, para o bem da trama, precisa ser polida. Isso é uma evidência de que as histórias em quadrinhos estão mais próximas do cinema que da literatura e que adaptar um romance para os quadrinhos se assemelha muito a transportá-lo para a luminosidade embriagante da tela.
Este é, aliás, um dos grandes trunfos do gibi Jubiabá. É puro cinema, sem deixar de ser uma ótima adaptação de um dos grandes romances brasileiros do século XX. Não tenta ser literário e acaba por conservar, paradoxalmente, a dicção do romance, preservando muito do estilo do autor e, em especial, o tom picaresco da fala dos personagens: “Dê seu jeito”, diz Baldo quando Osório, noivo de Maria dos Reis, os surpreende juntos ― fala e corpo conjugados magistralmente (p. 35). E então sabemos, de antemão, que a pose de Baldo não é bravata, é força mesmo, coragem do autêntico boxeador que ele será.
Posso estar enganado, mas acredito que esta adaptação de Jubiabá vai formar e motivar muitos leitores jovens: de quadrinhos, cinema e literatura. Estamos precisando.

Um comentário:

Lúcia Delorme disse...

Mayrant, obrigado pela dica sobre a autoria do Pancetti, mas eu não estou conseguindo pôr o nome do autor do quadro, tentei e não consegui. Vou ver novamente. Abraços.