Ilustração da capa: Enio Squeff. |
No ano do centenário do início da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), é lamentável que nenhuma editora brasileira tenha se incumbido de reeditar a novelinha Thomas, o impostor, de Jean Cocteau, publicada em 1923 na França e traduzida no Brasil em 1987, pela Rio Gráfica, na sua saudosa coleção Grandes Sucessos da Literatura Internacional. Poética, dinâmica e irreverente, é considerada uma das obras capitais deste multifacetado artista francês, que foi poeta, romancista, dramaturgo, cineasta, desenhista, pintor etc.
A narrativa concentra-se na figura do fanfarrão Thomas Guillaume, que se faz passar pelo sobrinho do grande general Fontenoy e, com isso, abre portas para si e muitas outras pessoas, tornando-se herói da Primeira Grande Guerra. Na trama, ele transita por muitos lugares, ganha a confiança de uma aristocrata, a senhora de Bormes, conquista o coração desta e de sua filha, Henriette, e faz da Belle Époque o seu palco. A Europa arde em guerra, mas Thomas arde de vida, como se ainda fosse criança e estivesse, em mais uma brincadeira, entre seus companheiros traquinas.
O estilo de Cocteau, de fraseado sintético e repleto de análises daquele mundo que a Guerra sepultou para sempre, seduz o leitor desde as primeiras páginas e o faz esquecer que está diante de um relato de caráter bélico. Acompanhamos as aventuras de Thomas como se este fosse, no fundo e na forma, um inconcebível Quixote do front, presente nas páginas apenas para nos fazer sorrir.
Com tal estratégia, Cocteau termina por nos sugerir, metaforicamente, que a guerra, e em especial aquela, não passa de um capricho, uma aberração que homens supostamente importantes, em seus gabinetes, decidem criar para a ascensão de si mesmos e de suas carreiras, a despeito do infortúnio dos países e das pessoas que representam. A ironia é que, sem esforço nem vontade, nem tampouco qualquer treinamento militar ou intento diplomático, Thomas se torna uma legenda maior que a dos "grandes homens" que fizeram eclodir a guerra. Sua experiência é, como a de todos os combatentes, universal: "A última cortina se levanta. A criança e a fantasia se confundem. Finalmente Guillaume conhece o amor". O front e o amor guardam os mesmos sentimentos. E esperanças.
Ainda teremos quatro anos de "celebrações" ao centenário da Primeira Guerra Mundial. Até o fim deste período talvez alguma editora brasileira decida reeditar esta empolgante obra de Jean Cocteau, uma das primeiras reflexões literárias sobre "a mais cruel das guerras".
3 comentários:
Seu texto me deu vontade de correr para a primeira livraria e comprar "Thomas, O Impostor"...grande abraço!
Mayrant...acabo de ler "Thomas, O Impostor". Comprei meu exemplar num sebo de Curitiba. Maravilha! Obrigada pela indicação.
Sinto-me feliz, Alessandra, por ter conquistado mais um leitor entusiasmado por esta novelinha de Jean Cocteau. Abraço!
Postar um comentário