Corria. Corria. Às vezes parava e, detrás de um poste ou de uma parede, revidava os tiros. Não saberia dizer se acertou alguém, não viu cair nenhum de seus perseguidores.
Atravessou a linha do trem, entrou pelo mato, chegou a um muro – e foi então que sentiu a picada, só isso, uma picada, seguida de uma expansão quente, e de uma sucessão de imagens, intercaladas pela fisionomia irreal daqueles dois policiais que o perseguiam.
Nem percebeu que estava no chão, imóvel. Ouviu passos, gritos de que estava caído, alvejado e:
– Esta morrendo... – disse o policial mais velho.
– É – resmungou o outro, que – lembrou de repente – chamava-se Ricardo da Luz.
A primeira mulher que amou. O rosto de sua mãe. O quarto onde se escondia com seus gibis. Ondas. Pipas. A fanfarra de pombos diante do Elevador Lacerda... O coelho de sua irmã. Morto.
O nada. A sensação inequívoca de estar nascendo.
Mais amanhã. Foto: Marcelo Reis, do livro Etnologia da solidão (2006).
3 comentários:
Essa noite foi pródiga.
Esse episódio está simplesmente MARAVILHOSO.
Mayrant, postei o livro apenas ontem. Eu e minhas atrapalhações e correrias, também às voltas com esses anjos, no sentido contrário do teu.
Cheguei em casa e estava lá o teu pequenino e lindo. Ainda não comecei a lê-lo.
Preciso de um crime imperfeito e merecedor da perpétua.
Quem sabe assim consiga ler. Pelo menos metade do que gostaria.
O teu pequenino já passeia comigo.
Grande abraço meu amigo.
E obrigada mais uma vez.
Marie
Tenho acompanhado os detetives e achei esse episódio sensacional!
Abraços,
Renata
Esse foi o meu preferido, Mayrant. Maravilhoso. Abraços.
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