Ontem, um amigo escritor confessou que uma de suas maiores frustrações foi não ter se tornado desenhista ou pintor. Disse isso naturalmente, sem mágoa, enquanto assistíamos à adaptação de O velho e o mar para um belíssimo curta-metragem de animação. Também tenho lá minhas frustrações dessa natureza, e não somente em relação ao desenho e à pintura. Estimo em demasia os músicos, sobretudo aqueles que dominam seu instrumento ao ponto de parecerem uma extensão do mesmo: a violonista espanhola Anabel Montesinos, Astor Piazzolla, Nelson Freire, o sideral Earl Hines... Certa vez li que Hemingway preferia ter se tornado músico de jazz, desejo partilhado por Orson Welles. E há escritores que confessaram grande decepção por não ter seguido a carreira de jogador de futebol ou a de ator. Por sua vez, há atores que declararam ter nascido para outro destino, como James Dean: “Representar é ótimo, e a satisfação é imediata; mas sinto que meu talento é mais para dirigir e, além disso, meu grande medo é escrever. Escrever é Deus. Mas ainda não estou pronto para esse ofício. Sou muito jovem e tolo. Para escrever é preciso ter certa idade; mas sei que quando começar... algum dia...” Infelizmente ele não teve tempo para “ter certa idade”, para aquele “algum dia” projetado e que lhe traria, quem sabe, muito mais satisfação, pois morreu com apenas 25 anos. Prova talvez de que é a vida que nos conduz.
Imagem: cartaz de Vidas amargas (1954), de Elia Kazan, baseado no romance A leste do Éden, de John Steinbeck.
3 comentários:
Adoraria me dar ao luxo de guardar certas frustrações. Mas não posso. Para o meu azar, nasci fora de época e não tenho inclinação para nada. É assim que vai ser. No mais, aquele abraço.
Eu queria ter uma voz tão áspera quanto o que eu penso quando tento exprimir o meu pseudo-canto.
Mayrant,
cada um com seu fardo alegre... Essa animação russa de "O Velho e o Mar" é uma obra-prima, antologia do Anima Mundi.
Abraço.
Tom
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