Um livro não pode ir na íntegra para a tela. Fazer um filme de um romance ou de um conto é preencher vazios deixados por estes e promover outros que eles haviam preenchido. Parece paradoxal, mas não é. O cinema é imagem com imagens, fotografia em movimento; e a literatura, imagem com palavras, com sentidos. O cinema mostra, nos faz ver; a literatura sugere, nos faz imaginar. No cinema há a apresentação de uma realidade; na literatura, a representação, pois as palavras encenam em nossa cabeça o que dizem em seu entrechoque semântico. E essa diferença entre cinema e ficção promove efeitos bem diversos e curiosos. Em São Bernardo, para dar conta da introspecção de Paulo Honório e seu desejo de análise e organização do mundo à sua volta, León Hirsman adensa o aspecto psicológico do romance de Graciliano Ramos. Isso obrigou que um dos romances mais velozes da literatura brasileira se convertesse num dos filmes mais lentos do nosso cinema. Aí está a medida do que o cinema exige e obtém, mostrando; e a literatura proporciona e sugere, dizendo.
3 comentários:
Muito que bem. Uma tremenda satisfação ver suas observações finalmente registradas. Referência. Aquele abraço. T
Muito bom teu texto. Mesmo. Vou mandá-lo para uma amiga com quem noutro dia conversava sobre o filme do Meirelles baseado no Ensaio sobre a Cegueira do Saramago.
Ela tinha acabado de ler o livro e ficou meio decepcionada com o filme.
Sabe aquela: Mas o livro é mmmuiiiiitooo melhor...
Quis dizer-lhe exatamente o que você escreveu. Tentei com outras palavras.
Obrigada pela lucidez da sua resposta.
Abraço
Marie
Qdo criança, meu pai lia São Bernardo pra mim. Nunca esqueço das imagens que criei daqueles "olhos voltados para dentro". Não troco minhas fantasias por nada... Bjs.
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