O que nos faz gostar de um texto, um poema, um romance, um conto, um quadro, um filme? Nem sempre estética é suficiente, eis a verdade. Segundo o escritor dinamarquês Hans Jorgen Lembourn, gostar ou não de uma obra de arte “depende do que se espera, do que se quer, de como se é”. Por exemplo, no livro Duas existências, de Jean Giraudoux, que reúne suas anotações diárias da juventude e da velhice, há um apontamento que não me canso de ler, há quase vinte anos, embora para algumas pessoas não signifique absolutamente nada:
“Villegouin, segunda-feira de Páscoa, 1892.
Uma bonita nuvem.”
O que tais palavras nos dizem? Que o jovem Giraudoux olhou para o céu e viu uma bonita nuvem, e que isso foi tudo o que lhe aconteceu naquele dia ou talvez o que de mais importante lhe aconteceu, a ponto de merecer uma anotação em seu diário? Talvez. E para mim o que elas significam? Sinceridade, naturalidade, espontaneidade, sensibilidade, poesia. Ou tão-somente a evidência de que muitas vezes a beleza – e o efeito que ela proporciona – não está na invenção, mas na surpresa, na imprevista aparição do simples num contexto em que se espera encontrar o exótico, o frenético. Muito do que escrevo tem esse propósito, mas só muito raramente chego a um resultado satisfatório. Talvez porque a profundidade do simples seja, em si, a mais difícil de alcançar.
Bem-aventurados os que conseguem.
Pintura: Summer landscape (1917), de Egon Schiele (1890-1918).
3 comentários:
O mínimo que posso dizer é que esse post é genial.
Abraços,
Renata
Muito raramente? Não necessariamente. Aquele abraço. T
Muito bom Mayrant.
Me fez lembrar Calvino.
Sempre aprendo aqui.
Abraço
Marie
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