Tentei contar nos dedos os filmes brasileiros atuais que, de fato, apresentam algo novo em assunto (a dor humana mais simples, que é viver) e modo de filmar (através de um ângulo que nos sensibilize sem evidente apelo ao melodramático) e não completei as duas mãos.
Aquele filme que acabamos de ver e já queremos ver de novo, pois, mesmo depois de encerrado, continua a ecoar e a nos desafiar com a sua carga de ambiguidade... Aquele filme que nos transforma sem que o percebamos, pois a suposta transformação compreende apenas um insuspeitável acréscimo à nossa percepção do que seja o indivíduo ou o mundo... Aquele filme cuja intenção é apenas contar uma história com (e pelo) peso de si mesma, sem segundas intenções, notadamente políticas ou sociais... Aquele filme que não se fixa em nenhum tipo específico (o adolescente, a mulher, o negro, o pobre, o nordestino, o homossexual), nem em certas datas da História ou em determinados contextos sociais, e que, no entanto, é o Indivíduo, é a História e o contexto que mais nos interessa, o das Relações Humanas.
Esse tipo de filme só além-fronteira ou, de quando em quando, aqui, se algum cineasta ou roteirista se desprende daquilo que, nas telenovelas, chamo A Hora do Panfleto e da Utilidade Pública: aquele momento recorrente em que o personagem, em conversa com outro, recomenda, esclarece, explica, apresenta, conscientiza, com a intenção clara de recomendar, esclarecer, explicar, apresentar, conscientizar.
Contem vocês também nos dedos os filmes brasileiros e, se encontrarem algum Filme, me recomendem.
Imagem: cartaz do filme franco-romeno Casamento silencioso (2008), dirigido por Horatiu Malaele. Crítica irônica e bem humorada aos regimes políticos que desprezam o Indivíduo.